sexta-feira, 18 de abril de 2008

O relato de Juca sobre sua aventura na floresta do Jambeiro ( continuação )

18:37 - Minha primeira reação foi olhar para José. Com certeza esta espingarda nas mãos da empregada apontada para mim, faz parte da brincadeira não é? Mas eu sabia que não era. A espingarda não estava nos planos deles, assim como eu também não estava. Eu a trouxera e aquilo definitivamente não era uma brincadeira. Minhas suspeitas se confirmaram ao ver o semblante de José.
Ele estava boquiaberto.
A tranquilidade que estava se apoderando nos últimos instantes, quando finalmente decidira me contar toda a história agora se fôra. O suor empapava sua camisa e um leve tremor nervoso fazia suas têmporas saltitarem alegremente.Contudo, José estava controlado e eu torcia para que ele desse cabo da situação. Pelo contrário, algo me dizia que minha vida iria durar muito, muito pouco.

- Beatriz, o que você está fazendo? - falou o jardineiro em voz baixa, aproximando-se um pouco da mulher.

- Eu que devia lhe perguntar isso, José! - guinchou raivosamente Beatriz - Era segredo, lembra? Quando eu achei este maldito mapa e nós traçamos esse maldito plano, a minha única exigência foi que ninguem soubesse de forma alguma,não foi? Então no primeiro imprevisto você conta tudo?

- Mas minha querida, não foi um imprevisto qualquer, é o Juca - falou calmamente José, tentando controlar o nervosismo. A arma agora estava apontado na direção e algo na feição doentia de Beatriz dizia que ela não estava de brincadeira - eu tive que contar a ele, o que poderiamos fazer?

- O que? - gritou Beatriz - simplesmente poderíamos amarra-lo e deixa-lo aqui para os pais acharem. Quando descobrissem o garoto nós já estariamos longe!

- Ele podia morrer - disse baixinho o jardineiro - nós...

- QUE MORRESSE ENTÃO! - berrou Beatriz, perdendo de vez a pouca compostura que tinha - Desse jeito, ele aprenderia a nunca mais se intrometer em assunto alheio - concluiu. A arma agora tremia freneticamente em sua mão. O dedo médio esticado na direção do gatilho balançava perigosamente. Eu percebi esse perigo.José também.

- Mas Beatriz...tinhamos combinado que ninguem ia se machucar com isso - falou o jardineiro em tom de súplica - e é o Juca, não quero fazer mal a ele.

Senti uma imensa gratidão pelo jardineiro e pensei que, se pudesse, entregaria todo o tesouro para ele de boa vontade. Ele merecia.

- Eu também gosto do garoto, José - disse Beatriz, a voz vacilando um pouco - mas nós iremos ser presos. Temos que fazer alguma coi...

- Eu não denunciarei ninguém - disse falando pela primeira vez, fiquei feliz ao constatar que minha voz não estava tremendo - eu promet...

- NÃO SE META! - gritou mais alto do que nunca, Beatriz, virando a arma na minha direção. José que, pelo visto, não se descuidara e fôra sistemático a todo momento, voou para cima dela no intuito de desarma-la a todo o custo. Por pouco conseguiu, o cano da arma se ergueu em direção ao teto esquisito do interior do Jambeiro e , por um momento, senti um alívio.
Então um disparo ecoou no interior da árvore.
Inicialmente pensei que havia ficado surdo e que a bala teria atingido minha orelha, mas aos poucos minha audição foi voltando e pude focar de novo o casal. O tiro havia sido para cima e ninguem tinha se ferido ainda. A arma permanecia comprimida entre os dois, sendo que agora José parecia estar começando a dominar a situação. A arma já virava para beatriz quando outro tiro quebrou a tensão. Sendo que dessa vez ele não saiu da espingarda. Veio de fora. E Juca viu.
Silêncio.
Mais uma vez, surdez.
E Beatriz caiu.

Um filete de sangue escorreu pelo chão empoeirado do interior do tronco quando Beatriz caiu em um perfeito decúbito frontal emitindo uma pancada oca na queda. O tiro acertara suas costas.
José gritou desesperado, largou a arma e correu para a entrada do tronco. Parou quase que imediatamente ao ver o que o esperava do lado de fora. Quatro policiais fardados estavam prostrados ali fora, de armas em punho e apontavam para ele. Mais atrás , escorados em uma Aroeira, estavam os pais de Juca. Ambos com roupas de trabalho e com os rostos muito abatidos. A mãe de Juca, provavelmente devia ter chorado muito. Haviam manchas profundas e escuras logo abaixo de seus olhos e ela segurava um lenço na mão direita.

- Mão na cabeça, senhor - gritou um policial gorducho mais próximo do tronco - você esta preso.

Merecido. Pensou o jardineiro ao ser algemado e levado para fora da floresta onde provavelmente uma ou duas viaturas o aguardavam para leva-lo a um local onde ele se tornaria uma pessoa muito pior do que, de fato, era.
Para mim tudo não passou de um borrão etéreo e não dei atenção aos gritos da minha mãe ao me abraçar, nem às perguntas dos policiais para mim, muito menos ao fato de que a excelente cozinheira Beatriz havia morrido na minha frente.Estava alheio a tudo isso. Só houve um momento ao qual eu me recordo nitidamente dessa sucessão de fatos ocorridos das 19:00 às 21:00 desta noite trágica. Foi quando um dos policias - baixinho, meio atarracado e que exalava um forte odor de drops de menta - perguntou se o jardineiro, José, era culpado de tudo.

Ele salvou a minha vida, eu respondi.


Sábado. 23: 25 - Juca terminou o seu relato com a frase "Ele salvou a minha vida, eu respondi."

O relato era composto de uma tristeza incomensurável, porém Juca não achava que o fim havia chegado. Ele queria salvar José. Tirá-lo da prisão. Descobrira na sexta feira através dos seus pais que no caso de José, poderia ser paga uma fiança, mas que - obviamente - aquele cão traidor deveria apodrecer na cadeia para sempre, explicou enfaticamente o pai de Juca no jantar.
Juca ia salva-lo. E já imaginava como.

No Domingo de manhã, Juca acordou bem cedo e foi na floresta. Todo o mistério e o medo que ele sentia daquela floresta se perdera. Até a real idade de Juca se perdera nos últimos dias. Ele julgava ter envelhecido uns 5 anos. Após sete minutos de caminhada, passando facilmente por entroncamentos, raízes, galhos e espalhando as folhas agilmente com os pés, Juca chegou na clareira onde ficava o Salgueiro. Até o Sábado pela manhã ela estava interditada e apenas a polícia tinha acesso. Mas como era um caso sem muitos mistérios a se resolver, a polícia logo abandonou o local. O serviço do Dever precisava ser exercido em outros locais. Apressadamente, Juca irrompeu pela entrada - agora aberta - do Jambeiro e afastou com dificuldade o pedregulho que ficava do lado direito do interior do tronco. Alí estava. A passagem cavada por José para o local indicado no mapa. O mapa sumira. Muito provavelmente José levara consigo, mas Juca não precisava dele. Algo o dizia que ele apenas precisava seguir o túnel cavado por José.
E Juca seguiu. Entrou no túnel - que era um pouco apertado para um adulto, mas perfeitamente adequado como esconderijo para uma criança - e foi adentrando em seu espaço cada vez, passando por curvas, por vezes subindo ou descendo, as vezes ouvindo o cantarolar dos pássaros, que o fazia pensar que estava proximo da superficie e muitas vezes sem ouvir absolutamente nada. Apenas a sua ofegante respiração e suas passadas pelo túnel. Após uns vinte minutos de busca pelo túnel,ele terminou. Algo que parecia uma pequena caverna, se estendia no final e no centro dela, havia uma caixa de madeira.
Madeira do próprio Jambeiro, pensou Juca.
Sem pensar duas vezes Juca apanhou a caixa e voltou pelo caminho do túnel. Abriria quando voltasse ao seu quarto. Já na floresta Juca veio pensando que talvez alí não estivesse contido dinheiro suficiente para libertar José, afinal de contas, a caixa era bem pequena. Tinha uns trinta centrimentos de largura e uns 10 de altura. E não pesava nada. Se não tiver o suficiente, o que eu faço?
Juca subiu as escadas de sua casa e se trancou no quarto. Sua camisa estava empoeirada e o suor molhava-lhe as faces. Mas isso não o preocupava. A ansiedade era grande demais e ele não podia esperar mais nenhum minuto.

E foi contando até três que Juca abriu a caixa.

Foi tomado de um susto imediato. Seguido de um pavor. Não havia tesouro ao contrário, era uma carta. Uma carta antiga.Muito antiga.
Não me resta mais nada, se não ler esta inusitada carta. Pensou Juca, frustrado com sua descoberta.

Mas ao ler as primeiras frase, sua frustração passou e sua ansiedade voltou tão rápido que lhe deu um tontura. Sem acreditar, olhou para o papel novamente e leu:

Eu sei o que você deseja. Sei tudo o que você deseja.
Eu te darei o que você deseja. Tudo o que você deseja.
A partir de hoje.

E a seguir havia uma carta. Uma longa carta.

Então, vamos lá - disse Juca, e começou a ler. (continua)

sexta-feira, 28 de março de 2008

O Caju e a Castanha

Existia no quintal da casa de meus avós um grande cajueiro. E como era grande! Mais que grande, era imenso! Suas folhas eram verdes e amarelas, eu nunca sabia ao certo quais eram verdes e quais eram amarelas. Elas pareciam sempre mudar de lugar. Como era estranho! Mas era uma estranheza bela. Era um belo, imenso e colorido cajueiro.

O cajueiro do quintal do vovô parecia ser o único no mundo que nasciam cajus todos os dias. Era também muito velho e, não sei se pelo tamanho, mas eu sempre associava o cajueiro a um velho sábio. E muito experiente.

Os Cajus que caiam do cajueiro eram muito orgulhosos de si. Se sentiam extremamente imponentes pelo fato de serem “daquele” cajueiro. Assim também eram as Castanhas. Todas essas atitudes "egocêntricas" e "pretensiosas" vinda das frutas tinham que causar algum conflito, um dia.

E não foi diferente.

Um certo dia pela manhã, entre a algazarra de Cajus recém nascidos que olhavam abismados o mundo novo em que estavam e comentavam aos berros com os colegas mais próximos, se sobressaíam duas vozes. Eram um Caju e sua respectiva Castanha, que discutiam em alto e bom som, roubando a cena perante aquele milagre do nascimento que ocorria no cajueiro.

-Você não entende... – argumentava a Castanha.

-Nem quero entender! – empertigava-se o Caju, falando cada vez mais alto – Onde já se viu, vocês, meras Castanhas, serem mais importantes que nós. Que piada! – Finalizou, arrancando risos dos Cajus mais velhos.

-Para seu governo, somos mais importantes sim! A fruta somos nós: as Castanhas.

-E que diferença faz? Na prática, nós somos as frutas. Vocês são extremamente desprezadas e... Ai! – o Caju gritou ao ser interrompido por uma mão que o arrancara de um dos galhos.

A pessoa que arrancou o Caju, desceu vagarosamente do pé, arrancando alguns outros Cajus pelo caminho e, ao chegar lá embaixo, retirou a Castanha do Caju e arremessou-o ao chão levando consigo apenas a Castanha.

-Extremamente desprezada, não é Senhor Caju? – gritou de longe a Castanha, enquanto o homem que a levou preparava uma pequena fogueira próxima ao cajueiro.

-Morra queimada sua debilóide!-praguejou carrancudo, o Caju.

Nesse momento, uma criança – provavelmente eu mesmo na flor da idade – pegou o caju e começou a chupá-lo com uma imensa vontade.

-E você morra seco, caju de uma figa! – respondeu a castanha, enquanto o fogo era atiçado em sua direção.

O Caju e a Castanha foram morrendo pouco a pouco, mas continuaram se insultando até não terem mais forças para prosseguir com tal ato.

No mesmo quintal, o grande cajueiro observava toda a cena com uma triste, porém reflexiva, expressão ao longo do seu tronco.

-Crianças... – comentou ele finalmente.

domingo, 23 de março de 2008

O Relato de Juca sobre sua aventura na floresta do Jambeiro (continuação)

17: 45 - "Clic" - fez a arma quando puxei o gatilho. Desesperei-me ao ver que a arma engasgara e não havia expelido bala nenhuma. Tomado pelo medo, pisei num galho demasiado fraco e , antes mesmo de ver o monstro apontando e gritando em minha direção, cai do abaceteiro indo parar no chão fofo e repleto de folhas que amorteceram a queda.
- Pegue-o e traga aqui - sibilou uma voz familiar vinda do interior do tronco. Eu não conseguia ve-lo, pois as últimas nesgas de sol já haviam desaparecido, dando lugar a uma tenebrosa escuridão.
"Meus pais em breve perceberão a minha demora e então as coisas irão piorar.Ou não", pensava enquanto o "monstro" me carregava com dificuldade, indo em direção ao grosso tronco do Jambeiro.
- Muito bem - disse mais uma vez a voz vinda de dentro do tronco, quando o "monstro" me colocou na entrada - muito bem feita, por sinal - da árvore - Agora, volte a sua função - ordenou.
O monstro retirou-se sem dizer nada e foi fazer algo parecido com uma "vigília" em volta do tronco.
- Vire-se rapaz - sussurou a voz ao meu ouvido e eu não precisei pensar duas vezes antes de saber quem era.
Quando eu me virei, lá estava José, o jardineiro, com uma pá em uma das mãos e um papel velho na outra, olhando para mim com expressão que misturava furia e apreensão:

- O que você está fazendo aqui? - perguntou o jardineiro olhando para mim que fitava o chão.
- Eu que pergunto, o que você está fazendo aqui! - disse erguendo a cabeça de modo à fitar o velho. Não era a hora de ficar com medo.
- Não é da sua conta! - disse ele olhando ao redor do interior do tronco do Jambeiro onde estavam - definitivamente, não deveria ser da sua conta.
- Mas...mas...você deveria estar morto - disse sem saber o que falar - o monstro, ladrão, seja lá o que ele for, deveria ter te matado.
- Morto?Eu?Oras moleque, que disparate! Por que eu deveria estar morto?
Deu certo. A minha estratégia de atrasa-lo havia dado certo. Eu sabia que naquele momento os meus pais já estariam desesperados atrás de mim, afinal de contas sumira eu e a espingarda. Em breve eles chegariam na floresta.
- Então...faz uns dias que eu venho observando a movimentação do "monstro", e percebi que dias depois do seu aparecimento, você desapareceu. Supus que ele quisesse lhe tirar do caminho.
O jardineiro riu profusamente dos meus devaneios e fiquei assim por alguns minutos mas, como se algo lhe fizesse retomar a consciência, ele voltou a si e ficou sério novamente. Agachou-se com dificuldade e , sustentando-se com as pernas, disse baixinho:
- Olha garoto, eu não tenho nada contra você. Muito pelo contrário. E não queremos roubar sua casa, nem nada. Só que o que estamos fazendo é um pouco...arriscado e o fato de você estar aqui atrapalha e muito os nossos planos. - Eu percebi que ele estava nitidamente sem saber o que fazer devido a minha presença.Então, arrisquei:

- Já que não é nada de ruim nem comigo nem com a minha família, por que você não me diz o que é? Talvez eu possa pensar em uma "desculpa" para explicar o meu desaparecimento e livrar a pele de vocês.
O Jardineiro ficou estático. Seus olhos se fixaram em um canto obscuro do tronco, onde havia sido colocada uma pedra.O suor escorria de suas faces enrugadas e ele parecia pensar com muita cautela. Passado uns cinco minutos, ele falou:

- Muito bem então. Vou lhe contar toda a história. Há cerca de duas semanas, nós descobrimos um mapa, na verdade ela descobriu lá na sua casa e veio me mostrar. Era um mapa que indicava que existia um tesouro no jardim. Imagine Juca, montes de ouro no jardim de sua casa!A trilha indicada pelo mapa começava aqui no Jambeiro.Então bolamos o plano. Ela se vestiria de monstro e ficaria fazendo cobertura durante as noites enquanto eu trabalharia em achar a trilha do tesouro que o mapa mostrava. Não demorei muito para abrir uma entrada no Jambeiro e ver que dentro dele havia uma espécie de tunel. Logo ali - e apontou para o local onde se encontrava a pedra. Mas o tunel não estava completo, e nos ultimos dias eu venho cavando o restante do túnel que leva ao local indicado no mapa, que pelos meus calculos ficam bem próximos a sua casa. Nossa meta era acabar hoje, mas agora já não sei...
- E por que não nos dizer? - perguntei ansioso - toda esta história parecia ter saído de um livro, e eu lutava para acreditar que aquilo era impossível, mesmo sendo engolfado pela adrenalina que toda esta história trazia consigo.
- Oras Juca! O terreno é de vocês, logo, o tesouro é de vocês por direito. Mas veja bem, vocês são ricos, vivem bem, já eu e ela passamos por diversas dificuldades em nossas vidas e precisamos muito do tesouro.
- Quem é ela? - perguntei, já sabendo que ele se referia a pessoa que estava vestida de monstro lá fora.
- Sou eu, Juca querido - disse uma voz conhecida e ao olhar para o portal, eu e o jardineiro, vimos estupefatos Beatriz - a empregada de minha casa - nos dirigir à palavra apontando a espingarda do meu pai, que havia caido lá em meio as folhas, para nós.

- A brincadeira acabou- disse ela - Para os dois.

(continua)

sábado, 15 de março de 2008

A vida é um erro.

Em um dado momento da vida, você percebe que alguma coisa nela - por mais incógnita que seja - está errada. Começa cedo. Ainda quando bem pequeno você ficava bravo porque lhe privavam das coisas que você mais gostava, então você chorava - por raiva - e, quanto mais você chorava mais lhe era retido o direito de fazer aquilo que desejava. Você não entendia. Alguma coisa ali estava errada.
Então você cresceu um pouco e passou a se conformar com a realidade de que não era possível ter tudo o que queria na hora que lhe bem-entendesse. Você continuava não entendo o porque, mas acreditava que seu pais sabiam o que era melhor para o seu bem-estar e o seu futuro. Não demorou muito e , com o amadurecimento, você foi entendendo o real motivo de todas aquelas privações e represálias.Tudo graças a maravilhosos exemplos referentes a "desestruturação comportamental da família" que a sociedade atual lhe apresentou, você viu de camarote grande parte dos problemas gerados por causa de excesso de violência; excesso de autoritarismo; excesso de liberdade, dentre tantas outras "exceções" no modo ideal de boa conduta na criação de um ser humano.
É, seus pais estavam certos. Acertaram todas as vezes que mandaram você entrar às oito horas da noite para dormir, acertaram quando não deixaram você passar o dia vendo desenhos na TV, acertaram precisamente quando não deixavam você brigar com o seu irmãozinho; acertaram até quando mandaram você engolir o choro e ir dormir em silêncio...Você começou a entende-los. Mas foi um mero engano seu, supor que a partir deste momento você deixaria de achar que as coisas estavam erradas. Muito pelo contrário, quando você passou a entende-los, você não descobriu apenas os "nobres motivos de seus pais com as restrições impostas na sua infância", aos poucos você foi descobrindo, de forma gradativa, tudo - absolutamente tudo - sobre eles.Foi nessa fase de sua vida que você viu : Seus pais erram. E muito. Assim como eu,você ou qualquer outra pessoa, eles também tem defeitos e estão, a todo momento, suscetíveis à erros. Neste momento, meu caro, você deixou de ser criança e , coincidentemente (?), tudo pareceu estar errado e sem explicação de novo. Foi o início de uma nova fase.
Você passou a se frustrar com tudo, com muita frequencia . Com os erros de seus pais, as injustiças, as omissões, as atitudes, as represálias, enfim, tudo pareceu absurdamente idiota e seus pais, outrora os imbatíveis "senhores da razão" passaram a ser iguais, ou até piores, do que você. Cheios de defeitos, contradições e equívocos. Neste ponto você enxergou-se em uma encruzilhada; de um lado você poderia pegar uma trilha conflituosa, cheias de confrontos, onde você iria - a todo custo - fazer predominar em sua vida os seus pré-concebidos ideais, derrubando assim com toda uma metodologia "atrapalhada" de seus pais. De um outro lado, você poderia tentar enxergar que a criação deles foi decorrente do aprendizado de toda uma vida, e que os equívocos são comuns a todos os humanos. Passaria então a "aguentar" até ter autonomia suficiente para fazer valer a sua vontade, sem entrar em choque com seus pais. Os caminhos estavam à mesa, porem uma dúvida permanecia, pois independente de qualquer que fosse a trilha escolhida, o erro ainda estava presente. Os equívocos e os defeitos também. Você ainda não entendia isso. Tinha algo errado.
Então, como sempre ocorre desde que o mundo é mundo - ao menos supõe-se -, o tempo passou. E ,de carona, você foi junto. E viu-se imerso em uma vida atabalhoada, repleta de obrigações, com filhos para criar, um emprego para manter e diversas outras preocupações que lhe tomavam todas as dimensões do tempo e espaço. Como a vida adulta era cansativa! Eis que um dia, cansado e irritado por conta do trabalho, você gritou sem precisão com seu filho. Brigou por ele ter posto um chiclete no tampo de madeira da mesa da cozinha. Mandou-o se deitar e foi para o quarto, ainda irritado. Já deitado na cama, você se arrependeu do que havia feito. Seu filho não tinha culpa de seu trabalho ser estressante, definitivamente. No dia seguinte você iria comprar para ele uma caixa de seus chocolates favoritos. Ia sim.
Foi com este ato que seu subconsciente entendeu o motivo de tudo. Dos erros, dos equívocos...era a vida. A vida real[...]


Os problemas são inevitáveis quando se está em uma vida como a nossa. Onde nem sempre a justiça vence, onde não existem fadas, nem gênios com lâmpadas mágicas; onde a felicidade se encontra quando se está com uma quantia de incontáveis dígitos em uma conta bancária...
Gênios, magos e valentes guerreiros são aqueles que fazem da vida real uma vida feliz, indiferentes às desigualdades, à hipocrisia e a subserviência existente. Infelizmente, poucos conseguem viver assim. Mas veja lá: ninguém tem culpa. Somos humanos e nos defendemos como podemos. Com tristeza, rancor, raiva, erros...Acho que agora dá para entender porque gostamos tanto da televisão e , por muitas vezes, nos refugiamos nela ( lembra que éramos privados dela quando criança?), porque gostamos tanto dos livros, dos quadrinhos,do cinema...pois é, gostamos tanto porque todos mostram algo que nem sempre é a vida real. Mostram um mundo onde os finais são felizes e os sentimentos e comportamentos são facilmente perceptíveis; um mundo onde se pode sonhar.
Pois bem, sonhem! O sonho é a maior arma contra as dúvidas e as incertezas da vida real. Sonhem. Sonhem muito, porque assim vocês conseguirão transformar suas vidas em um maravilhoso e inconfundível sonho. E serão felizes.


[...] |Você pode não ter percebido isto ainda, mas seu subconsciente e sua alma perceberam. Reflita um pouco e você verá também. Provavelmente você irá continuar achando que alguma coisa está errada mas lembre-se: A vida pode ser um erro. Mas errar é humano.

A vida é sua. Faça dela um sonho e seja feliz.




Diego.

domingo, 9 de março de 2008

O relato de Juca sobre sua aventura na floresta do Jambeiro (continuação)

16:o2 - Inicialmente a entrada na floresta foi fácil, eram apenas quatro da tarde e além da claridade, eu conhecia aquela parte da floresta como se fosse o meu quarto. Fui entrando precipitadamente, sem prestar muita atenção ao caminho que estava deixando para trás. Se eu soubesse o que isso iria me custar, não teria sido tão descuidado. Não mesmo.
"Que ótimo!", pensei, "continuando com esse ritmo chego ao Jambeiro antes das cinco, meia hora antes do monstro aparecer". Animado, acelerei cada vez mais a passada, pulando por cima de galhos quebrados, folhas secas e grossas raízes que rasgavam o chão devido a imponência de sua criação. O suor já empapava minha camisa quando cheguei a uma pequena clareira que se estendia na ala oeste da floresta onde, em seu centro, estava o Jambeiro. O foco de minha rota em busca do monstro, lá estava ele, imenso e robusto, carregado de folhas grandes e escuras que se espalhavam sobre ele e pelo chão a sua volta."Só falta um lugar bom para se esconder", pensei olhando ao meu redor. Contornei o Jambeiro procurando e não demorei muito para ver na orla da clareira um pequeno abacateiro, fácil de subir e repleto de folhas, o que facilitaria a camuflagem. Em poucos minutos subi, me acomodei e apoiei a espingarda em um galho à minha frente. Não iria segurá-la. Aprendi com o meu pai sobre a pressão que as armas fazem e não queria cair da árvore. Imagina se eu errasse o tiro...
17:40 -Minhas pernas doíam insistentemente, enquanto eu esperava o maldito monstro pendurado em um abacateiro na parte oeste da floresta. Pelos meus cálculos ele deveria ter aparecido a uns dez minutos e até aquele momento, nada. Meus braços estavam trêmulos e desde às cinco e meia que meu olho direito focava a mira da espingarda. Então, rápido como o cair da chuva, muitas coisas aconteceram.
Do tronco nodoso do Jambeiro, apareceu uma fenda que foi se alargando e dando lugar a algo semelhante a uma "entrada", parecendo um recorte feito em uma cortina incrívelmente feia. De dentro do tronco foi saindo lentamente o vulto de um homem, segurando em uma das mãos algo semelhante a uma capa. Ou melhor, uma fantasia. "O monstro é um ladrão!", pensei imediatamente e, em seguida, muitas conclusões vieram a minha cabeça de forma atropelada. O homem era um ladrão e, para invadir a minha casa, teve que matar o jardineiro e agora iria pôr o plano em prática. Havia outro homem saindo da abertura no tronco, mas eu não o vi. Em um solavanco apressado, ergui-me, foquei o olho direito na mira da espingarda e pousei o dedo indicador no gatilho. Esperei por cinco segundos que mais pareceram uma eternidade e - sem pensar duas vezes - atirei.

domingo, 2 de março de 2008

O relato de Juca sobre sua aventura na floresta do Jambeiro..

"Por volta das três e meia da tarde, Juca entrou sorrateiramente no quarto de seus pais, subiu no guarda-roupa e passou a mão na parte de cima do móvel. Lá estava ela. Velha e um pouco arranhada, Juca sentia perfeitamente os buracos e declives da velha espingarda de seu pai.Mesmo sem ver, esticou a mão e segurou no braço comprido da arma. Ele não entendia muita coisa detalhadamente sobre armas - seria espantoso para um garoto de onze anos, caso ele entendesse -, e só sabia que a arma sempre estava carregada com uma bala, pois ouvira os pais comentando sobre isto certa noite.Segundo o pai dele, era por precaução.Deveriam estar sempre precavidos. Para Juca, esta informação significava que ele não precisaria carregar a arma, o que era um alivio para ele.Ele não saberia como proceder.
Sem pensar muito, Juca saiu do quarto e desceu as escadas cuidadosamente para não derrubar a espingarda. Seu pai sempre o alertara dos perigos que uma arma poderia causar "acidentalmente".O barulho não era problema, pois Juca estava só em casa. Seus pais saíram para trabalhar e tinham a plena certeza que a empregada chegaria antes de Juca acordar, mas algo aconteceu e ela não foi trabalhar. Relatos posteriores comprovam de que a empregada, de nome Beatriz, recebera um telefonema no dia anterior informando-a de que ela estava dispensada de seus serviços no dia seguinte, pois a mãe de Juca não ia trabalhar. Juca jura de pés juntos até hoje que não foi ele quem deu este telefonema. Como se isto tivesse alguma importância depois do que aconteceu[...]"

*
A partir de agora, segue-se a história através do relato de Juca, escrito 50 horas depois do ocorrido.


15:00h -Lá estava a floresta na minha frente.Grande e escura como sempre foi, desde que eu nasci. E era nela que estava o inimigo que eu deveria enfrentar. O grande monstro que há três dias rondava minha casa.Meus pais não quiseram acreditar,então eu tinha que fazer algo antes que uma tragédia acontecesse. Respirei fundo e entrei na floresta.Ela era grande mas eu já sabia o meu destino.O grande Jambeiro que fica na parte oeste da floresta. Sei disso pois durante duas noites eu observei da janela do meu quarto no primeiro andar - com meu binóculo,claro- e vi uma movimentação naquela região.É lá que ele está e é para lá que eu ia.
Vocês devem estar pensando algo do tipo : "é isso que acontece quando se deixa criança ver TV demais". Pois bem, vou explicar o motivo que prova que esta história do monstro não era uma bobagem qualquer ( até porque nem assisto muita televisão, sei o mal que ela nos causa).
Foi assim, no ínicio da semana do ocorrido ( era uma Quinta-Feira quando entrei na floresta), o velho que aparava o jardim lá de casa, disse que as galinhas do vizinho foram encontradas mortas perto do Jambeiro e que ele estava ouvindo barulhos estranhos vindos da floresta quando aparava o jardim.Isso não seria motivo o suficiente,bom isso se ele não estivesse desaparecido desde terça.Desde o desaparecimento do jardineiro, eu passei a observar a movimentação na floresta todos os dias (exceto pela manhã,por conta das aulas), principalmente na área do Jambeiro, e todas as vezes eu encontrei movimentações suspeitas. Soube pela empregada na Quarta-Feira que mais galinhas do vizinho tinham sido encontradas mortas e que o vizinho tinha certeza de que havia um monstro a solta. Contei para o papai e ele disse que as galinhas estavam morrendo por causa da comida que o avarento do nosso vizinho dava para elas e que o jardineiro estava bebendo muito ultimamente e que provavelmente estava alcoolizado em algum lugar da cidade .Meu pai sempre foi muito céptico.
Percebendo que meus pais nunca iam fazer nada, decidi tomar uma atitude por conta própria e bolei o plano de matar o tal monstro, afinal de contas, devido a movimentação na floresta eu sabia exatamente os horários que ele atuava.Não seria dificil.
Eu pensava que não.

(continua)